Rio de Janeiro: o rio que não era rio

No dia 1 de março comemora-se o aniversário da cidade do Rio de Janeiro, uma das mais famosas cidades do Brasil, mundialmente conhecida por suas belezas e misérias. Em referência a essa cidade, a postagem de hoje comenta a respeito da origem de seu curioso nome. O tal "rio de janeiro" existe mesmo?

No dia 1 de março comemora-se o aniversário da cidade do Rio de Janeiro, uma das mais famosas cidades do Brasil, mundialmente conhecida por suas belezas e misérias. Em referência a essa cidade, a postagem de hoje comenta a respeito da origem de seu curioso nome. O tal “rio de janeiro” existe mesmo?

A história do Rio de Janeiro consiste num erro de interpretação geográfica. No dia 1 de janeiro de 1502 a expedição de três navios liderada por André de Gonçalves, contando com o capitão Gaspar de Lemos e o cartógrafo Américo Vespúcio, avistou uma entrada que acreditaram ser a foz de um rio. Por ser o mês de janeiro, aquele local foi nomeado de “rio de janeiro”. Porém, a suposta foz vista por aqueles portugueses, na verdade era a entrada da Baía de Guanabara.

Quanto ao nome ter sido um equívoco, alguns historiadores contestam isso. De acordo com Coaracy e Calmon, no século XVI, a palavra rio era genericamente usada para se referir a um estuário, baía comprida ou saco (um tipo de enseada alongada). Por tal perspectiva, os portugueses não teriam errado ao chamar aquela localidade de “rio”.

De qualquer forma, o nome Rio de Janeiro não foi oficializado de imediato. O Brasil ainda estava sendo explorado naquele tempo, sua costa estava sendo mapeada, condição essa que o mesmo lugar recebia nomes diferentes. No entanto, em 1504, o capitão Gonçalo Coelho adentrou a foz do suposto rio, percebendo que seu “estuário” era muito maior do que supunha-se. Isso levou a ele acreditar que o local seria uma baía na verdade.

Além disso, Coelho ordenou que um posto fosse montado ali naquela região. Assim, perto da foz do rio Carioca, hoje no Aterro do Flamengo, foi construída uma casa de pedra. O local foi chamado pelos indígenas de carioca (“casa de branco”). A localidade da casa que servia de abrigo foi erguida perto de uma fonte de água potável, chamada pelos portugueses de “aguada dos marinheiros”.

No mapa Universalis Cosmographia (1507) de Martin Waldseemüller, nesse seu mapa o qual mostra o nome do Novo Mundo chamado de América – em homenagem a Américo Vespúcio -, pode-se ver a costa brasileira, mas não há menção ao Rio de Janeiro, embora podemos ler o nome de outras localidades. Entretanto, no mesmo ano foi publicado o mapa de Johannes Ruysch, o qual cita um local chamado “Rio de Oreferio”, situado ao norte da “Baía dos Reis” (atual Angra dos Reis). Apesar do erro de grafia, esse é o nome mais antigo encontrado num mapa a se referir ao Rio de Janeiro.

Embora esse nome apareça no mapa de Ruysch, ainda assim, ele não foi usado regularmente. Condição essa que em 1519 a expedição de Fernão de Magalhães fez estadia no local, e Pigafetta, o cronista da expedição, relatou que aquele lugar foi nomeado pelo capitão Magalhães de “baía de Santa Luzia”. O que é até curioso, pois Magalhães e parte da sua tripulação eram portugueses, apesar de a maioria dos tripulantes serem espanhóis. Ainda assim, é curioso ele ter escolhido um novo nome.

Em 1530 o fidalgo e navegador Pero Lopes de Sousa, o qual participou da expedição de reconhecimento de Martim Afonso de Sousa, escreveu um diário de navegação a respeito dessa expedição. Em sua obra ele menciona que a localidade do Rio de Janeiro foi visitada. O interessante é que ele se referiu ao lugar como um “rio”.

Anos depois em 1554 quando os franceses decidiram estabelecer uma colônia na baía de Guanabara, a qual ficou conhecida como França Antártica, um mapa foi produzido sobre o lugar, e nele pode-se encontrar os nomes Rio de Janeiro e Guanabara. O nome Guanabara já era conhecido pelos portugueses, mas não era empregado regularmente. A palavra é de origem tupi e poderia ter três significados: iguaá-mbara (enseada do rio do mar), guanabara (mar do seio – devido a seu formato), kuaraná pará (mar que se assemelha a uma enseada). A ideia de associar essa localidade como uma grande enseada ou um mar se deve a suas dimensões, pois a Baía de Guanabara é a segunda maior baía do Brasil e uma das maiores do mundo.

No mapa da América feito por Diego Gutierrez em 1562, o Rio de Janeiro é identificado por “Rio de Genero”. Vale ressaltar que nessa década foram fundadas a Capitania do Rio de Janeiro e a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Por conta disso, tal nome se tornou definitivamente oficial, mesmo não se tratando de um rio. Além disso, em alguns documentos dos séculos XVI e XVII ocasionalmente se encontrava a expressão “baía do Rio de Janeiro”, a qual foi trocada por Guanabara, nome que conserva até hoje.

Referências:

CARVALHO, Carlos Delgado de. História da cidade do Rio de Janeiro. 2a ed. Rio de Janeiro: Secretária Municipal de Cultura e Departamento de Documentação e Informação Cultural, 1990.

COARACY, Vivaldo. Memórias da cidade do Rio de Janeiro. Belo Horizonte. Editora Itatiaia, 1988.

THEVET, André. As singularidades da França Antártica. Tradução Eugênio Amado. Belo Horizonte. Editora Itatiaia, 1978.

VARNHAGEN, Francisco Adolpho de. Diário da Navegação de Pero Lopes de Souza: 1530-1532. Lisboa: Typographia da Sociedade Propagadora de Conhecimentos Úteis, 1839.

Leandro Vilar
Leandro Vilar

Sou historiador, professor, escritor, poeta e blogueiro. Membro do Museu Virtual Marítimo EXEA, membro do Núcleo de Estudos Vikings e Escandinavos (NEVE).

Artigos: 57
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