O Tratado de Tordesilhas possui conexão direta não apenas com a história de Portugal e Espanha, mas com de vários países surgidos nas Américas, especialmente os oriundos da colonização portuguesa e espanhola. A origem do tratado remonta uma longa história de negociações entre os dois países pelo controle das terras descobertas no Atlântico. Um fato interessante é que outras nações como Inglaterra e França, que se tornariam importantes no século XVI, foram totalmente excluídas desses tratados.
Na década de 1450 o papa Nicolau V expediu as bulas Dum Diversas (1452) e Romanus Pontifex (1455), concedendo direito a Coroa Portuguesa e a Ordem de Cristo de conquistar, colonizar, escravizar e cristianizar as terras africanas do lado atlântico. Os espanhóis descontentes com esses privilégios dado aos portugueses, procuraram se assegurar do domínio do arquipélago das Canárias, algo confirmado com o Tratado de Alcáçovas (1479), que pôs fim à disputa dinástica entre os dois reinos, assegurou a posse espanhola das Canárias, e a posse de vários outros territórios insulares e africanos para Portugal.
Posteriormente, para assegurar de forma melhor tais negociações, Portugal solicitou do Papa Sisto IV a bula Aeterni regis (1481), a qual definiu que a costa africana e o Oceano Índico seriam de exploração exclusiva dos portugueses. Já os espanhóis deveriam explorar o Atlântico Norte e as águas para além do Açores. Na prática, a Espanha saiu perdendo com a bula, já que não era certeza que as Américas existiam, e mesmo que existissem, sua distância ainda era desconhecida.
Anos se passaram e Portugal investiu na exploração marítima e militar da costa ocidental africana, a ponto de negar investimento para Cristóvão Colombo (1451-1506), em enviar uma expedição para o ocidente. Com isso, Colombo voltou a procurar patrocínio dos espanhóis e dessa vez conseguiu um voto de confiança. Em 12 de outubro de 1492 ele relatou em seu diário de bordo, o avistamento de terras.
Ao retornar para a Espanha, o sucesso da expedição de Colombo rapidamente se espalhou pelas grandes cidades e portos, chegando a Portugal. No caso, os portugueses já realizavam expedições no Atlântico a quase cem anos, e a notícia de que haveriam terras para além dos Açores interessou o rei D. João II (1455-1495), que influenciado por seus ministros e a corte, tinha interesse em investigar tais novas terras “descobertas” por Colombo, navegador que inclusive viveu vários anos em Portugal.
Nesse ponto da história, o governo português alegou que as terras descobertas por Colombo estavam dentro dos limites estabelecidos pelo Tratado de Alcáçovas e a bula Æterni regis. O rei Fernando II de Aragão (1452-1516), considerando que se tratava de uma fraude, recorreu ao poder papal, autoridade respeitada por vários reis cristãos na Europa. Com isso, o monarca espanhol solicitou ao papa Alexandre VI, determinando a posse espanhola das terras descobertas por Colombo, no que resultou na bula Inter cætera (1493), que estipulou que todas as terras situadas a 100 léguas a oeste de Cabo Verde, pertenceriam a Espanha. Logo, isso legitimava o controle espanhol sobre as ilhas caribenhas encontradas pela expedição de Colombo. No entanto, o rei D. João II e sua corte, não compactuaram com a bula e pediram uma retificação da mesma.
A partir de uma reunião realizada na cidade espanhola de Tordesilhas, surgiu o Tratado de Tordesilhas (1494), o qual redefiniu a fronteira de exploração do Novo Mundo, estendendo o limite das possessões portuguesas de 100 para 370 léguas a oeste de Cabo Verde. O acordo bem mais promissor para os interesses portugueses, foi assinado em 7 de junho, sendo ratificado pela Espanha em 2 de julho e por Portugal em 5 de setembro.
Dessa forma, ambos os reinos estavam satisfeitos com o novo acordo. Colombo poderia seguir com suas expedições, desde que obedecendo a fronteira de 370 léguas. Por sua vez, Portugal assegurou suas explorações na costa de Labrador (1499), visitada por João Fernandes Lavrador e Pedro de Barcelos, e a costa da Terra Nova (1500), visitada pelos irmãos Gaspar e Miguel Corte-Real. Ambos territórios, atualmente no Canadá, não foram reivindicados pela coroa portuguesa, a qual se interessava neles por conta da pesca do bacalhau.
Porém, as terras visitadas em por Duarte Pacheco Pereira em 1498 e Vincente Yánez Pinzón em 1499, se mostraram mais preocupantes, pois eram terras ainda desconhecidas e os espanhóis já estavam navegando por ali, o que indicava ameaça de serem exploradas por eles. Por conta disso, a expedição de Pedro Álvares Cabral foi incumbida no ano de 1500, de fazer reconhecimento daquelas terras, antes de seguir para à Índia.
Finalmente em 1506 o papa Júlio II validou os territórios “descobertos” pelos espanhóis e portugueses no Novo Mundo, determinando que o limite de 370 léguas deveria ser respeitado, embora que na prática isso não ocorreu. No entanto, a divisão das Américas entre Portugal e Espanha havia sido estabelecida, mas isso desagradou outros dos países interessados em explorar aquelas terras, a Inglaterra e a França. E isso repercutiu em conflitos de interesses nas décadas seguintes.
REFERÊNCIAS:
ALBUQUERQUE, Luís de; MAGALHÃES, Ana Maria; ALÇADA Isabel. Os Descobrimentos Portugueses: As Grandes Viagens – II volume. Lisboa: Editorial Caminho SA, 1992.
SERRÃO, Joaquim Veríssimo. Portugal e o Mundo: Nos séculos XII a XVI. Lisboa: Editorial Verbo: 1994.