Os vikings usavam bússola?

Os vikings, termo hoje em dia usado de forma genérica para se referir aos povos nórdicos da Era Viking (sécs. VIII-XI) que deram origem…

Os vikings, termo hoje em dia usado de forma genérica para se referir aos povos nórdicos da Era Viking (sécs. VIII-XI) que deram origem aos atuais países da Dinamarca, Noruega, Suécia e Islândia, são conhecidos como exímios navegadores, os quais percorreram principalmente a região do Mar do Norte, no nordeste do Oceano Atlântico, mas também se aventuraram pelo Mar Mediterrâneo. Mas se eles eram bons navegantes como eles faziam para se localizar? Eles utilizavam bússolas?

Na época das expedições vikings já existia a bússola magnética (ou agulha magnética), sendo ela uma invenção chinesa. Todavia, esse invento somente existia em partes da Ásia, sendo desconhecido na Europa. Por conta disso, os povos europeus não faziam uso de bússolas magnéticas, mas em seu lugar utilizava-se outro tipo de instrumento de localização, a chamada bússola solar (ou agulha solar).

A bússola solar consistia numa estrutura circular feita geralmente de madeira ou pedra, com uma haste ao centro (gnônom), utilizado para se medir a altura e localização a partir da posição do sol e da sombra projetada pela haste. Alguns modelos continham uma segunda haste horizontal, a qual era usada para indicar a direção. Nas bordas encontram-se ranhuras para indicar as direções e ao centro da bússola havia riscos ou traços retos ou curvos para assinalar a marcação do sol ao longo do dia, baseando-se na sombra projetada, podendo saber se era de manhã, meio-dia ou à tarde.

Dessa forma, a bússola permitia que os navegantes nórdicos ou de outros povos, pudessem se localizar no mar, tendo como pontos de referência o Leste (nascente) e o Oeste (poente), em que a partir deles permitia se identificar as outras direções como o Norte e o Sul e consequentemente os demais pontos colaterais.

Embora hoje saiba-se que os nórdicos faziam uso desse tipo de bússola, no entanto, no século XIX e no XX, havia dúvidas quanto a isso devido à falta de bússolas dessas encontradas, além de que na literatura nórdica medieval não haver referências a tais instrumentos. Entretanto, em 1948, o arqueólogo Christen Leif Vebaek, descobriu uma bússola solar datada de cerca do ano 1200, encontrada num convento beneditino de Uunartoq, na Groenlândia.

Na época, alguns arqueólogos sugeriram que seria um objeto religioso ou um relógio solar. Essa dúvida perdurou por vários anos. Na década de 1990 estudos foram feitos com base nessa bússola para tentar compreender como os nórdicos a utilizavam. No ano de 2000 foi encontrado na Polônia, na ilha de Wolin, um disco de madeira com ranhuras, junto a um navio do século XI, do final da Era Viking. Uma evidência a mais de que os nórdicos conheciam tal instrumento. Nos anos seguintes novos estudos foram feitos, incluindo a criação de réplicas para serem testadas.

Apesar dos experimentos mostrarem êxito, no entanto, não se sabe como exatamente elas eram utilizadas pelos escandinavos, pois a forma de usar essas bússolas hoje é baseada no nosso entendimento geográfico e matemático, o qual é diferente dos povos da Era Viking. Mesmo assim, a bússola solar funciona.

Entretanto, além dessa bússola solar, os nórdicos teriam usado outro instrumento para auxiliar na localização marítima, a chamada pedra solar (sólarsteinn), a qual consiste num cristal quase incolor. Diferente da bússola solar, essa pedra é mencionada na literatura nórdica, apesar de não ser especificado sua forma, tamanho e o tipo de mineral utilizado.

Em 1967 o arqueólogo dinamarquês Thorkild Ramskou, sugeriu que essa pedra seria feita com cristal de cordiorita, encontrado na Islândia. Anos depois novos estudos apontaram que tais pedras solares poderiam serem feitas de cristal de calcita, também encontrados em localidades da Escandinávia e territórios vizinhos. Dessa forma, em dias nublados, a pedra solar ao ser apontada para o astro polarizava sua luminosidade, permitindo ao navegador em auxílio da bússola realizar seus cálculos mentais para definir sua posição e direção.

É preciso salientar que os nórdicos não faziam uso de cartas náuticas, tampouco possuíam cálculos geográficos e grande parte da população era iletrada, logo, o conhecimento marítimo advinha da observação e experiência prática. Dessa forma, graças a esses instrumentos – hoje em dia considerados rústicos -, somando-se ao fato de não haver mapas, o conhecimento dos paralelos geográficos e nem de bússolas mais precisas, ainda assim, eles conseguiram empreender longas jornadas marítimas pelo Atlântico Norte, descobrindo a Islândia, o sul da Groenlândia e chegando a costa do Canadá.

REFERÊNCIAS:

LANGER, Johnni. Bússola solar. In: LANGER, Johnni (org.). Dicionário de história e cultura da Era Viking. São Paulo: Hedra, 2018, p. 118-121.

LANGER, Johnni. Pedra solar. In: LANGER, Johnni (org.). Dicionário de história e cultura da Era Viking. São Paulo: Hedra, 2018, p. 566-568.

LANGER, Johnni; STERZA, Lorenzo. Strumenti solari nordici dell’Era dei Vichingi. Orologi Solari, n. 16, p. 57-65, april 2018.

Leandro Vilar
Leandro Vilar

Sou historiador, professor, escritor, poeta e blogueiro. Membro do Museu Virtual Marítimo EXEA, membro do Núcleo de Estudos Vikings e Escandinavos (NEVE).

Artigos: 56
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